quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

São Francisco

Encostei meus pés descalços na grama verde. Acima de mim o céu de Dezembro sem nenhuma nuvem, só o sol quente, claro, aconchegante.
Fechei meus olhos e senti o calor. Sei que era final de ano, porém sentia-me em plena primavera. A primavera nos dentes, como dizia Ney. Sorri como o sorriso da primavera de Chico Buarque, era nele que estava pensando, no Chico, no Jonas e no Francisco.
Chico Buarque me trouxe um rapaz de olhos cor de café claro, quase chá. E esse rapaz me trouxe o outro, o Francisco, a completude de toda a primavera.
Abri meus olhos, enfim, para contemplar não acima, nem abaixo, mas dentro de mim, a primavera brotando. Me importa se é verão? Me importa se algum dia eu senti o calor do sol? Não.
Chico Buarque cantou para mim a muito tempo atrás, naquelas montanhas verdes e hoje canto aqui e em qualquer lugar, para o outro: De que calada maneira ele chega assim sorrindo, como se fosse a primavera...
Francisco chegará no outono, mas a vida, com ele, sempre será primavera. Chico já tinha profetizado.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Aniversário

Sabe filho, nunca gostei do meu aniversário. Sempre foi uma oportunidade para eu ter a certeza de que não era especial, sempre faltava alguém lembrar, ligar, escrever. E eu sempre me sentia triste com isso.

Mas, afinal, quem é assim tão especial?

Hoje eu vejo que em meu aniversário ganhei os melhores presentes que se podiam ganhar. Ganhei primeiramente a vida, sem essa não poderia ter ganhado mais nada.
Ganhei a Bia, não propriamente no meu aniversário, mas é como se fosse. Em Novembro, a 12 anos atrás, ela era um amontoado de células, que se dividiram, formaram um embrião, um feto e finalmente, em Agosto, um pouco atrasada, ganhei-a e com ela ganhei um amor maior.
Ganhei meu primeiro emprego de verdade, celulares. Quem diria que em meio as linhas telefônicas ganharia amigos reais, que me presenteiam até hoje.
Ganhei a dois anos um gato, pequeno, sem bigodes. Mas era meu, senti-o meu e é meu até hoje. Ganhei também um rapaz, de olhos de café fraco, sorriso manso e amor mais manso ainda. E sem saber no momento, ganhei um futuro.
Ano passado ganhei uma casa, mais que isso, ganhei um lar. Ganhei também outro gato que entrou devagar, se apossou do sofá e já é meu também.
Mas entre tantos presentes especiais filho, o maior de todos é você. Não te ganhei em Novembro, mas te sentir dentro de mim, te ver por uma televisãozinha pequena e saber a revolução que daqui a uns meses acontecerá quando eu receber meu presente atrasado, me torna melhor, me torna completa.
E esse ano não desligarei o celular, quem quiser ligar, ligue, quem não quiser não precisa. A pessoa mais importante passará o dia todo ao meu lado, ou melhor, dentro de mim.

Acho que isso me torna especial, não?!

domingo, 10 de outubro de 2010

Inferno astral

Havia uma pedra no meio do caminho.
Tentei movê-la.
Não rolou. Literalmente.

Olhei a minha volta
e gritei:
A L G U É M ?

Ninguém.

Sentei e
esperei, esperei.
Na-da.

Me levantei
e arrumei um jeito de
ultrapassar a pedra.

Sozinha.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Caroço de maçã

Entenda,

Eu não tenho mais passado.
Acabou, acabou.
Não mais importa.

O futuro?
Ele virá.

Presente.
Ah, esse sim.
É do tamanho de um caroço de maçã
E, está dentro de mim.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

"Comédia para se ler no computador" ou "Quase plagiando L. F. Verissimo" ou ainda "O tiozinho tarado"

Em homenagem a Mari que me deu a ideia.

Nosso primeiro contato foi em um dia muito do tedioso, ele pediu-me que o ajudasse a procurar um emprego, tudo bem, é um tiozinho respeitoso e desempregado em busca de ajuda e como eu não tinha absolutamente nada para fazer, ou seja, estava morrendo de tédio (já até estava vendo o Dr. House vindo examinar meu cadáver, ele diria: "Ela deve ter morrido de uma doença auto-imune, talvez Lupus. Espere! Veja como estão os olhos dela, sim, sim, esses olhos esbugalhados só querem dizer uma coisa, essa coitada morreu de tédio", mas, voltando ao assunto). Eu o ajudei e como não é fácil, é lógico que ele não conseguiu nenhum emprego naquele dia.
Percebi que o tiozinho voltava, agora, todos os dias e veja bem, ele era uma pessoa normal (diria até que feio pra caramba!), nunca que eu imaginaria algo excuso. Enfim, ele vinha todos os dias e eu na minha inocência pensava: Nossa, que legal, a esposa (sim, ele era casado, dava pra ver a aliança) deve sentir orgulho dessa empolgação em querer um emprego. Ledo engano, a empolgação era por outra coisa, que logo, logo eu descobriria.
Um dia (sim, de tédio mortal), levantei do nada e me prostrei atrás do indivíduo, juro que não foi por querer, juro. Mas, acontece que assim que cheguei perto do tiozinho, ele fechou as janelas que estava vendo. Hum, muito suspeito, pensei eu. Resolvi ficar de olho.
Depois desse espisódio, percebi que ele sempre me olhava de esgelha. (Sabe quando você está fazendo algo errado e fica olhando em volta para ver se alguém está percebendo? Ah, você nunca fez nada errado, tá! Meu nome é Bozo). O mistério foi ficando cada vez mais misterioso (?).
Então, numa bela terça feira eu o solucionei (tá, não foi bem eu, mas tá valendo). Estava eu, linda e fofa no orkut trabalhando, quando chega uma senhora e o que mais me impressionou, sorrateira, sem fazer barulho, como se não quisesse se percebida, estranho. Observei com mais atenção, vai que era uma terrorista árabe querendo nos matar a todos? (Se bem que pelo tipo físico estava mais para nazista da Segunda Guerra Mundial, mas, não vou julgar, cada um escolhe o ditador preferido para seguir). Enfim, ela chegou quieta, passou por mim e parou atrás do tiozinho, que nesse momento estava concentradíssimo nas suas páginas de pornografia? emprego. Tão concentrado que nem reparou na mulher atrás de si.
Ela aproximou-se mais, tocou no ombro dele e cochichou umas palavras em seu ouvido. Droga! Quero ser um mosquito! Ele assustou-se (e essa parte me faz rir até agora), olhou para trás e pateticamente tentou fechar as páginas de seu computador. Não que tenha adiantado, ela já estava observando-o a um tempo e já tinha visto tudo o que tinha para ver. Ela cochichou mais alguma coisa em seu ouvido e (pasmem) veio falar comigo. Juro que pensei em correr. Vai que ela achasse que a culpa era minha, que por trabalhar aqui eu que deixava o seu marido (como fui descobrir depois) ver pornografia (e só para vocês saberem é proibido acessar pornografia aqui, mas como eu nunca tinha pegado o senhor com a boca na botija, não podia fazer muita coisa), fiquei com medo.
Mas, nada disso, ela só veio conversar comigo, acho que queria desabafar e ao mesmo tempo falar para todo mundo que estava junto a verdade sobre o indivíduo.
Ela me disse que trabalhava o dia todo, o sustentava e ele dizia que ficava aqui todo dia procurando um emprego. Que ele era um vagabundo, que se fazia passar por (pasmem de novo) Pastor de igreja evangélica para dar em cima das mocinhas casadoiras que entravam em um bate papo evangélico (sim, isso existe, eu vi com meus próprios olhos). Imagina a cena: ele entra no bate papo evangélico, coloca um nick do tipo "pastor gostosão" e xaveca as mocinhas (que de inocentes não devem ter nada, visto que aceitam xaveco de um tio chamado "Pastor gostosão") dizendo: "E aí, de que igreja você é? Você usa saia comprida? E por baixo dela o que usa?" Mais tosco impossível.
A esposa disse que de evangélico ele não tem nada, só de trambiqueiro mesmo, que estava cansada, queria dar um pé nele e tal. Ela saiu arrasada (se bem que eu acho que deveria ser aliviada porque, obviamente ela super conseguirua algo muito melhor - ele era feio de verdade) e vocês acreditam que o tiozinho não foi correndo atrás dela? Não! Ele ficou no computador. Meu Deus! Como pode?
Depois do episódio ele ainda veio uns dois dias, continuava no bate papo (agora eu estava esperta e já conseguia até ler um pouco das conversas: "E aí gatinha, você acha que o valor do dízimo está muito alto?"). Pensei que a esposa tinha-o botado para fora de casa e ele estava se consolando (super!).
Até que em um belo dia (uns dois dias depois) eis que o tiozinho não veio. Hum, estranho. Já se passaram cinco dias e ele não voltou (não, eu não estou com saudade!), presumo que a coitada esposa o tenha aceitado de volta e sua vida de pastor tenha acabado. Mas isso é só presunção.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Cores


Minha cor favorita não é mais azul. Agora eu gosto de verde. Sei lá porque, talvez seja o meu espírito palmerense aflorando, ou talvez tenha simplesmente cansado da cor e queria mudar.
Eu mudei muito desde quando escolhi o azul, lembro que tinha uns 14/15 anos e ia redecorar o quarto, daí decidi que seria azul. Por que? Porque eu era rebelde, não queria nada rosa como todas as outras meninas e também (admito) que gostava do azul, é uma cor linda, das mais lindas que existem.
De lá pra cá muita coisa aconteceu, eu era a menina do papel de seda que ficou forte e mudou, eu mudei e muito. Isso as vezes me deixa triste, o passado, por mais que tenha sido ruim nos deixa com saudade, porque será? Não sei, só sei que eu sinto saudade de gostar de azul.
Hoje a vida é verde, as escolhas são verdes e eu já não posso voar no céu porque escolhi outra cor, escolhi ficar com os pés no chão, na grama, verde.
Hoje caminho pelas montanhas que só existem em meu pensamento e olho o céu. Dá saudade. Mas eu olho para baixo, abro um sorriso e repito: "Agora eu gosto de verde".

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A menina e o pássaro

Era uma vez uma menina de tranças que adorava passarinhos, mais do que isso, ela adorava o "seu" passarinho.
Ele era tão lindo, com suas cores fortes, de um tom de azul que ela nunca tinha visto igual. E como cantava! Todo dia, de manhã, a menina acordava com o canto do seu pássaro, como que dando um bom dia, como que saudando o dia da maneira mais delicada que existia.
A menina sentia-se feliz assim, dava amor ao pássaro e era retribuida com o canto mais lindo.
O tempo passava e ela percebia que seu bichinho já não era o mesmo, ele não cantava mais, parecia triste, parecia que o mundo dentro da gaiola e perto da menina não mais o satisfazia.
O pássaro, ela não sabia, sentia-se cansado, queria ganhar os ares, sentir o vento em suas penas e por mais que amasse a menina, achava que já estava na hora de partir.
Um dia, a menina, percebendo a intenção do pássaro, pediu uma última música e ele a cantou, lindamente, mais linda que nunca.
Ela chorou e disse baixinho: "Obrigada passarinho, você me fez muito feliz, eu vou sentir sua falta".
Ela abriu a gaiola e o pássaro saiu, voou até a janela e olhou para a menina. Ela sorriu.
O pássaro voou para o céu azul e como foi bom! Ele estava bem agora.





Voa avôzinho, você está bem agora.
+01-08-2010

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Armadilhas

Hoje acordei mais uma vez com aquela voz irritante dela. Ela não me deixa dormir nem mais dez minutos, nem cinco, nem meio minuto a mais.

Acordei obviamente mal humorado. Ela olha pra mim e diz, porque essa cara? Você não gosta mais de mim e blá blá blá...

Faço um chá e ligo a televisão pra ver se assisto alguma notícia bem ruim, só pra ter a sensação que a minha vida não é uma merda.

Lógico que ela não me deixa nem fazer isso. Ela ainda reclama da minha falta de interesse pelas coisas dela.

Sabe. Ela me fala. Eu ainda me lembro e olha que não faz tanto tempo assim, quando eu era sua musa inspiradora e você me escrevia poemas tão lindos. Hoje você só faz reclamar e reclamar e quando decide escrever sobre algo é sempre sobre o seu maldito passado. Sabe o que eu acho? Que o seu passado é a sua musa inspiradora! Ela disse assim, na lata, parecendo uma metralhadora, sem nem parar para respirar.

Meu, o que ela quer? Eu já não casei com ela? Já não vim para esse fim de mundo e deixei todo o resto pra trás POR ELA? Já não arrumei uma merda de emprego em uma repartição para que ela possa ficar “cuidando” da casa (como se ficar na internet vendo site de gravidez fosse cuidar de algo). Ela só enche o meu saco. Estamos sem dinheiro. Ela diz. Você gasta só com porcaria, desse jeito nunca vamos ter nada. Como compraremos o carrinho do bebê? MEU! Ela nem está grávida e se continuar desse jeito, eu é que não serei o pai!

Lógico que eu penso no passado, é óbvio! Antes as coisas fluiam tão melhor. Eu não me sentia preso, não me sentia asfixiado, como se tivesse colocado um saco plástico em volta da minha cabeça e o ar fosse acabando devagarinho, cada vez mais sem ar, cada vez mais pensando no antes, porque o presente me parece pesado demais.

Eu fujo para o passado, fujo para as minhas ex namoradas, que veja bem, não são nada comparadas ao que ela é, mas sei lá, elas me davam leveza, ou eu é que era leve. Pensar nos erros do passado é mais fácil do que ver os erros que agora cometo.

O pior é que eu a amo, amo mesmo, de verdade. Ela é/era uma garota sensacional. Inteligente, bonita, divertida, carinhosa e surpreendente. Só não esperava que a surpresa fosse essa. Ela murchar. E eu, segurar em minhas mãos uma flor que não tem mais vida nenhuma.

Tenho vontade de sumir daqui, deixar tudo e correr para bem longe. Não aguento mais arrumar desculpas para me afastar, não aguento mais olhar para o rosto dela e não conseguir enxergar mais um motivo para estar ao seu lado.

Desligo a televisão e vejo meus gatos brincando. Ela olha pra mim e sorri, eu sorrio de volta, sem muita vontade pra ser sincero, mas, sorrio.

Nisso a vida vai passando e eu fico preso na armadilha que eu mesmo criei. Nessa armadilha que as pessoas insistem em chamar de amor.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Não lembrar é esquecer?

"Faça uma lista de grandes amigos,
quem você mais via a 10 anos atrás.
Quem você ainda vê todo dia,
E quem você já não encontra mais..."

(Pega o telefone, disca e espera)

Eu:Oi, sabe quem tá falando?
Outro(a): Não, deveria saber?
Eu: Não sei, mas, sei lá, eu tinha uma esperança de que soubesse...
Outro(a): Mas não sei, desculpa, se deveria saber, ou não né? Se esqueci sua voz é porque algum motivo você me deu, mas afinal, quem é você?
Eu: Dei, dei o pior dos motivos, eu não continuei do seu lado quando deveria, você não tinha mesmo o porque lembrar minha voz.
Outro(a): É, eu me sinto sozinho(a) as vezes, talvez se não tivesse me deixado...
Eu: Você me perdoa?
Outro(a): Mas, como posso perdoar se nem sei quem você é? Eu fiquei sozinho(a) e te esqueci. Eu não posso perdoar alguém que não faz mais parte da minha vida.
Eu: Eu estou ligando pois gostaria de voltar a fazer parte dela, eu penso em você todos os dias, não há um dia em que me esqueça do quanto erámos felizes, eu lembro nitidamente, inclusive do seu sorriso quando me via, um sorriso de criança, de Natal, de céu azul, você não lembra mesmo?
Outro(a): Não, não lembro e se eu gostava tanto de você como me diz, eu acho que nem quero lembrar, quem me garante que não vai me deixar outra vez?
Eu: Mas você nem sabe quem eu sou pra saber se pode ou não confiar em mim.
Outro(a): E eu deveria confiar em quem nem conheço?
Eu: Mas, você me conhece, só não se lembra, eu sou a...
Outro(a): EU NÃO QUERO SABER QUEM É VOCÊ! Me deixe em paz! Eu já te perdi uma vez e não vou perder de novo! ME DEIXE EM PAZ!
(O telefone é desligado)

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Eu não sou flor


Sabe quando você sente que algo murchou? Eu não consigo encontrar palavra que defina melhor o que está acontecendo...
Paciência me falam. Vai passar outros dizem. E, até, é frescura.
Se olha no espelho, o que você vê? Eu vejo, vejo e não consigo encontrar n-a-d-a.
Está vazio.
Murchou e eu nem vi. Ou talvez tenha visto, mas fingi que não era comigo. Vamos beber, eu dizia. Beber é bom, nos faz esquecer. É, até o dia em que você não aguenta mais beber. Outro sintoma de que tudo murchou.
Eu deveria o que? Qual é o contrário de murcho? Eu não sou flor, nem quero ser. A vida não devia murchar diante dos meus olhos, eu não devia murchar diante dos olhos alheios.
Principalmente daqueles olhos tão adorados. Olhos cor de café fraco, quase chá. Olhos que não consigo mais encarar, pois não quero que vejam o que eu vejo, não quero que olhem para o vazio.
Cansei de ser estações do ano.

sábado, 27 de março de 2010

Morrendo lenta e dolorosamente

"Será que hoje ele me mata?" Pedro acordou em esse pensamento, de novo, como em todos os dias. desde muito tempo atrás.
Levantou-se, calçou os chinelos, foi ao banheiro e olhou-se no espelho como fazia todos os dias, olhou-se e o pensamento veio outra vez, "será que é hoje o dia em que ele me mata? Ou será que acontecerá algo que mudará tudo e me dará mais um dia?"
Seu futuro assassino já era um velho conhecido, tiveram seu primeiro contato durante umas férias escolares, quando Pedro ainda era um adolescente. No fim de um dia em que ele não fizera absolutamente nada, como é normal nas férias, conheceu esse predador e se viu desesperado, nunca em sua breve vidinha sentiu-se tão aterrorizado. Precisava fugir, fazer algo para livrar-se de coisa tão ruim, precisava mudar tudo, ser outra pessoa, para que ele nunca o encontra-se outra vez.
Fugiu de casa, foi para a capital, começou a vender chicletes no semáforo. Com o frio, as noites em bancos de praças e os outros perigos que enfrentava em sua nova vida, quase sentiu-se seguro outra vez, ele não o mataria. Até que em um dia de sol escaldante, quando Pedro estava sentado em um banco vendo a vida passar, o avistou. Mesmo depois de tanto tempo o reconheceu, e, principalmente, reconheceu como o fazia sentir-se. O desespero voltou.
Fugiu outra vez, foi para outra cidade, voltou a estudar, entrou em uma faculdade, se formou, conheceu alguém, casou-se, teve filhos, ganhou dinheiro. Tudo isso premeditadamente para fugir, escapar de seu algoz. Sim, o casamento e a família também podem ser uma fuga, e até nos esconde bem, por um tempo.
Sua vida ia passando, mas, nunca se via livre completamente, a unica diferença é que quando o desespero vinha não podia fugir, tinha família agora, não podia simplesmente desaparecer como das outras vezes.
E isso nos remete ao dia de hoje, com a visão de Pedro ao espelho. Ultimamente seu desespero havia retornado e aumentava cada dia mais, todos os dias eram uma espera do derradeiro momento de sua morte.
Será que estava imaginando coisas, será que existia mesmo o predador que o encarava em seus momentos mais ociosos, será que o desespero iria aumentar tanto a ponto de acabar com tudo?
O que fazer, o que mudar para se livrar disso? Pedro pensava e pensava sem conseguir chegar a conclusão alguma.
Mais uma vez olhou-se no espelho e o mesmo pensamento de todos os dias o invadiu: "Um dia esse Tédio ainda me mata".

sábado, 13 de março de 2010

Novo adeus

O que sempre esteve explícito é que você era dela e eu era dele. Disso tirávamos que nunca seríamos ou teríamos um nós.
Senti sua mão em meu corpo, quis prolongar aquele estado de semi-dormência para te sentir só um pouco mais.
Nossos fugazes encontros eram isso, nada mais do que prolongamentos de momentos, mãos e bocas, prolongávamos o gozo para que eu te sentisse só um pouco mais dentro de mim.
Toda vez era a mesma coisa, primeiro a volúpia, a vontade de ter e ser e ter mais um pouco. Depois vinha a satisfação e consequentemente a melancolia e o desespero.
Eu ficava esperando o momento em que você diria que precisava ir, pois ela o aguardava. Eu diria que tudo bem, pois, ele também me aguardava, abaixaríamos os olhos por um ou dois segundos e quando os levantamos eu já estaria com os meus encharcados, você pegaria minhas mãos e diria que não precisava ser assim, me amava, nós tínhamos uma escolha. Mas, você sempre soube que não, não tínhamos escolha, e era isso que eu sempre te lembrava aos gritos. O desespero tinha chegado.
Eu já perdi a conta de quantas vezes eu te disse que essa era a última, que nada se repetiria. Só para ouvi-lo concordar. E, quando estivéssemos com a certeza da despedida, eu o olharia súplice e você me beijaria, como se fosse nosso último momento na Terra.
Eu te amo, eu diria. E você sorriria com aquele seu meio sorriso que eu nunca sabia se era de alegria ou dor, assim, nos deixaríamos ficar, enroscados em mais um prolongamento.
Você vai estar aqui semana que vem não é? Não sei, isso não é certo... Mais um beijo, e com ele a certeza de que haveria uma semana que vem.
Nós éramos de outras pessoas, eu nunca seria sua e você nunca seria meu, mas, sempre haveria a semana que vem.
Adeus. Adeus.